Das Cláusulas Abusivas (golpes)
Cláusula
abusiva é aquela que coloca o consumidor em desvantagem exagerada, ou
seja incompatível com a boa-fé ou a equidade. Não se restringe ao contrato de
adesão, mas a todo e qualquer contrato de consumo, escrito ou verbal.
Art. 51. São nulas de
pleno direito, entre outras (rol exemplificativo),
as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
Consequências
da existência de cláusulas abusivas:
1) Invalidade:
a) isto é, a cláusula não vale, não produz efeito no contrato, é como se não
existisse; b) deve ser reconhecida judicialmente, por provocação do interessado
(consumidor) ou de ofício, por serem as normas do CDC de ordem pública e
interesse social (art. 1º) (Nesse sentido é o pensamento da doutrina). STJ-381:
Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da
abusividade das cláusulas. Não se admite a revisão de ofício de cláusulas
contratuais consideradas abusivas em contratos sujeitos às normas de defesa do
consumidor (AgRg nos EDcl no REsp 1100270/RS); c) em regra a nulidade da
cláusula não afeta todo o contrato (§ 2º); d) os efeitos da sentença que
reconhece a nulidade da cláusula são ex
tunc, isto é, desde a formação do contrato; e) além da nulidade da cláusula,
o fornecedor pode vir a ser sancionado pelo Procon (art. 56); f) por se tratar
de matéria de ordem pública e interesse social, não há preclusão, de modo que
pode ser alegada a qualquer tempo e grau de jurisdição (doutrina). É vedado em
recurso especial o reexame do conjunto fático-probatório e de cláusulas
contratuais, o que atrai a incidência dos enunciados n. 5 e 7 da Súmula desta
Corte (AgRg no REsp 1234858/RS); g) o CDC não fixou prazo prescricional para se
alegar a nulidade cláusula abusiva, logo, é imprescritível a pretensão de
anular cláusula abusiva (doutrina). O prazo prescricional de demanda em que se
pleiteia a revisão de cláusula abusiva de contrato de plano de saúde é de 10
(dez) anos, nos termos do art. 205
do Código Civil (REsp 1261469/RJ).
2)
modificação ou revisão da cláusula (art. 6º, V).
Rol
exemplificativo: a expressão “entre outras” indica que o CPDC enunciou hipóteses
exemplificativas de cláusulas abusivas, o que é reforçado pelos incisos IV e XV.
A Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça tem publicado, em
cumprimento ao Regulamento do CPDC (Dec. 2.181/1997), elenco de cláusulas que
entende abusivas e que estao sendo praticadas.
I - impossibilitem,
exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer
natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de
direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa
jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
Cláusula de
não indenizar.
Normas
repetidas: a) é direito básico do consumidor a efetiva reparação de danos
patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos (art. 6º, VI); a
garantia legal de adequação do produto ou serviço independe de termo expresso,
vedada a exoneração contratual do fornecedor (art. 24); e é vedada a
estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a
obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores (art. 25).
Exemplos: 1) empresa
de transporte não pode exonerar-se ou atenuar a sua responsabilidade pelo
extravio das bagagens dos passageiros; 2) o estacionamento não pode exonerar-se
da responsabilidade por materiais deixados no interior do veículo; 3) o
supermercado ou shopping que entrega a administração dos seus estacionamentos a
terceiros, não se exonera da responsabilidade de indenizar o consumidor, em
razão da responsabilidade solidária (art. 7º, p. ún., e art. 25, § 1º); 4)
cláusulas limitativas de dias de internação em contrato de planos de saúde; 5) as
cláusulas limitativas da indenização previstas nos arts. 246
e 257
do Código Brasileiro de Aeronáutica não prevalecem sobre as disposições do CDC
(REsp 169.000/RJ e 154.943/DF).
Cláusula
exonerativa ou limitativa do dever de indenizar x cláusula limitativa de
direito do consumidor.: o CDC veda a cláusula exonerativa ou limitativa do dever de
indenizar, mas permite a cláusula limitativa de direito do consumidor, desde
que redigida com destaque, permitindo imediata e fácil compreensão (art. 54,
§4º). Exemplo de cláusula limitativa de direito do consumidor: não cobertura de
transplante de fígado em contrato de plano de saúde.
II - subtraiam ao
consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste
código;
Exemplo: direito de arrependimento (art. 49, p. ún.).
Aplica-se ao distrato de promessa de compra e venda o CDC e o art. 924 do Código Civil de 1916. Todavia, pelas peculiaridades da espécie, não há nulidade da cláusula nele estabelecida. Hipótese que não se confunde com a disposição contratual em que se estabeleça não ter a parte direito ao reembolso integral, em caso de desfazimento do contrato (REsp 530683/MG).
III - transfiram
responsabilidades a terceiros;
Não há problema de o fornecedor de serviço de estacionamento contratar seguro de responsabilidade, pois nesse caso o consumidor pode acionar judicialmente a ambos, sendo a responsabildiade solidária (art. 101, II, do CDC, c.c. o art. 80 do CPC).
IV - estabeleçam
obrigações consideradas iníquas (injusta),
abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem
exagerada (lesão consumerista), ou sejam
incompatíveis com a boa-fé (cláusula geral) ou a eqüidade (equilíbrio);
Ver o §
1º.
Trata-se
de cláusula geral proibitiva da utilização de cláusulas abusivas.
Esse
inciso consagra o instituto da lesão consumerista, que se
caracteriza somente com a situação de desproporção entre as prestações do
fornecedor e do consumidor. Difere-se da lesão civilista,
prevista no art. 157 do CC, que exige, além da desproporção entre as prestações
do contratantes, a situação de necessidade ou inexperiência da parte
prejudicada.
Lesão x
teoria da imprevisão, embora tenham em comum o desequilíbrio/desproporção da
relação jurídica. A lesão é marcada pelo desequilíbrio que nasce com o
contrato, passível de invalidação, ao passo que a teoria da imprevisão
pressupõe contrato válido que se desequilibra depois. Na teoria da imprevisão o
desequilíbrio é superveniente e não gera a invalidação do contrato mas sim a
resolução ou revisão deste.
STJ-302:
É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a
internação hospitalar do segurado.
É abusiva
a cláusula contratual de seguro de saúde que estabelece limitação de valor para
o custeio de despesas com tratamento clínico, cirúrgico e de internação
hospitalar (REsp 735750/SP).
STJ-382: A
estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por
si só, não indica abusividade.
A
capitalização mensal de juros somente é permitida em contratos bancários
celebrados posteriormente à edição da MP 1.963-17/2000, de 31/3/2000, e desde
que expressamente pactuada (EDcl no AgRg no REsp 681439/RS).
Revela-se
abusiva, por ofensa ao art. 51, incisos II e IV, do Código de Defesa do
Consumidor, a cláusula contratual que determina, em caso de rescisão de
promessa de compra e venda de imóvel, a restituição das parcelas pagas somente
ao término da obra, haja vista que poderá o promitente vendedor, uma vez mais,
revender o imóvel a terceiros e, a um só tempo, auferir vantagem com os valores
retidos, além do que a conclusão da obra atrasada, por óbvio, pode não ocorrer
(AgRg no REsp 997956/SC).
É
possível a condenação por dano moral, no âmbito de recurso especial, quando o
Tribunal a quo reconheceu a manifesta abusividade da cláusula que previu a
exclusão de materiais ou próteses
empregados no ato cirúrgico e determinou a cobertura de tais despesas, mas
qualificou a situação como mero dissabor ou mero desacerto contratual, ao
argumento de que o descontentamento da parte não gera violação de direitos da
personalidade a ensejar dano moral, porque não se trata de revisão da matéria
fática, mas de modificação da qualificação jurídica conferida ao caso concreto
pelo acórdão recorrido, o que afasta o óbice da Súmula 7 do STJ (REsp
1190880/RS).
A
jurisprudência deste Tribunal Superior consagrou o entendimento de ser abusiva
a cláusula contratual que prevê o reajuste da mensalidade de plano de saúde com
base exclusivamente em mudança de faixa etária, mormente se for consumidor que
atingir a idade de 60 anos, o que o qualifica como idoso, sendo vedada,
portanto, a sua discriminação (AgRg nos EDcl no REsp 1113069 / SP).
Inciso
vetado: V - Segundo as circunstâncias e, em particular, segundo a aparência
global do contrato, venham, após sua conclusão, a surpreender o consumidor.
Em pauta
anulação de "cláusula surpresa: projeto de lei que visa a reinserir no CDC norma que considera
nula a "cláusula surpresa" - definida como a que venha a surpreender
o consumidor após a conclusão do contrato - está pronto para entrar na pauta da
Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle
(CMA).
VI - estabeleçam
inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor;
Porque
atenta contra o princípio da facilitação da defesa do consumidor (art. 6º, VIII).
VII - determinem a
utilização compulsória de arbitragem;
Essa
vedação ocorre porque atenta contra o princípio do livre acesso do consumidor
aos órgãos judiciários (art. 6º, VII).
Arbitragem
constitui o meio alternativo para a solução de litígios sem intervenção do
Poder Judiciário, regulada pela Lei n. 9.307/1996.
VIII - imponham
representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor;
Era
comum, principalmente em contratos bancários e de cartões de crédito, existir
cláusula pela qual o devedor (consumidor) nomeava seu bastante procurador, em
caráter irrevogável e irretratável, representante indicado de antemão pelo
credor (fornecedor), para que, em nome do devedor, emitisse nota promissória,
letra de câmbio ou outra cambial, entre outras faculdades.
IX - deixem ao
fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o
consumidor;
Consumidor
vai à revendedora de veículo e assina proposta de contrato, que será enviada à
matriz para verificações. Enquanto isso, o consumidor não pode contratar com
outro fornecedor.
X - permitam ao
fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral;
XI - autorizem o
fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja
conferido ao consumidor;
XII - obriguem o
consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual
direito lhe seja conferido contra o fornecedor;
XIII - autorizem o
fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade (da prestação) do contrato, após sua celebração;
XIV - infrinjam ou
possibilitem a violação de normas ambientais;
XV - estejam em
desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;
Exemplo:
a cláusula de eleição foro, quando dificultar a defesa do consumidor.
A
cláusula que estipula eleição de foro em contrato de adesão é, em princípio,
válida, desde que sejam verificadas a necessária liberdade para contratar
(ausência de hipossuficiência) e a não inviabilização de acesso ao Poder
Judiciário (REsp 1073962/PR).
CPC: Art. 112. Argúi-se, por meio de exceção, a incompetência relativa. Parágrafo único. A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu.
Esse
inciso vem reforçar o caráter exemplificativo das cláusulas abusivas.
XVI - possibilitem a
renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias.
Renunciar
é abrir mão de direitos.
As
benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias (art. 96 do CC). São
voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do
bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor (§ 1º). São
úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem (§ 2º). São necessárias as que
têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore (os reparos de um
telhado, infiltração ou a substituição dos sistemas elétrico e hidráulico
danificados).
§ 1º Presume-se
exagerada, entre outros casos, a vontade que:
I - ofende os
princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
Os
princípios fundamentais do CDC são a boa-fé, a transparência, a confiança, a
vulnerabilidade, a segurança, entre outros. A cláusula contratual que ofende
qualquer princípio é presumidamente abusiva.
II - restringe
direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal
modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
Exemplo:
cláusula de não indenizar; incisos X, XI e XIII.
III - se mostra
excessivamente onerosa (onerosidade excessiva) para
o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse
das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso.
O
dispositivo deixa claro que a onerosidade excessiva terá que ser apurada no
caso concreto, com a finalidade de equilibrar as prestações das partes, em caso
de circunstâncias extraordinárias.
Não é
abusiva, por si só, a cláusula dos contratos de seguro que preveja que a
seguradora de veículos, nos casos de perda total ou de furto do bem, indenize o
segurado pelo valor de mercado na data do sinistro (REsp 1189213/GO).
§ 2° A nulidade de
uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato (regra), exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de
integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes.
Regra da
manutenção do contrato: ocorre quando a eliminação da cláusula não leva à do
contrato.
Texto vetado: § 3º - O Ministério Público, mediante inquérito civil, pode efetuar o controle administrativo abstrato e preventivo das cláusulas contratuais gerais, cuja decisão terá caráter geral.
O veto foi inócuo, pois essa é uma das atribuições privativas do Ministério Público, prevista na Lei da Ação Civil Pública.
§ 4° É facultado a
qualquer consumidor ou entidade que o represente requerer ao Ministério Público
que ajuíze a competente ação para ser declarada a nulidade de cláusula
contratual que contrarie o disposto neste código ou de qualquer forma não
assegure o justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes.
Aula ministrada por Francisco Demontiê Gonçalves Macedo
Art.
257. A responsabilidade do transportador, em relação a cada passageiro e
tripulante, limita-se, no caso de morte ou lesão, ao valor correspondente, na
data do pagamento, a 3.500 (três mil e quinhentas) Obrigações do Tesouro
Nacional – OTN (uma OTN vale R$ 76,00 em 2012), e, no caso de atraso do
transporte, a 150 (cento e cinqüenta) Obrigações do Tesouro Nacional - OTN.
CC/1916:
Art. 924. Quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz
reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de
inadimplemento.